Boa tarde,
SOBRE O AVAL, leia este artigo… muito interessante e penso que coincide com seu caso:
A (des) necessidade da outorga uxória no aval prestado como garantia de notas promissórias
Uma breve análise à luz da Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e do caso concreto
CURTIR
COMENTAR
BUSCAR
Publicado por Vida Catarina Vasconcelos
há 2 anos
Em uma execução de título extrajudicial fundada em notas promissórias inadimplidas (art. 784, inciso I, do Código de Processo Civil) e em instrumento particular de confissão de dívida (art. 784, inciso IIII, do Código de Processo Civil), houve a penhora de bem imóvel daquele que figurou como avalista das notas.
O cônjuge do executado opôs embargos de terceiro e, dentre os argumentos, suscitou a nulidade da garantia, porque o aval prestado às notas promissórias se deu sem a vênia conjugal – supostamente imprescindível. Mas esta garantia, prestada sem a outorga do cônjuge casado em regime de comunhão parcial de bens, de fato é nula?
O aval é disciplinado pelo art. 897 e seguintes do Código Civil [1], e assim conceituado por SÍLVIO DE SALVO VENOSA:
“O aval representa uma declaração cambial, cuja finalidade é garantir o pagamento de um título de crédito. […]. O aval é, portanto, uma garantia pessoal, na qual um terceiro se responsabiliza pelo cumprimento da obrigação estampada no título, nas mesmas condições do devedor ou de qualquer obrigado [2]”.
Pela disposição literal do art. 1.647, III do Código Civil [3], o cônjuge não pode prestar aval ou fiança sem a autorização do outro. E o art. 1.649 do mesmo diploma normativo [4] ainda prevê que a falta de autorização torna anulável o ato praticado, podendo o outro cônjuge pleitear-lhe a anulação.
Assim, numa fria análise do caso concreto, a garantia prestada sem a vênia do cônjuge embargante seria anulável, do que decorreria também a desconstituição da penhora do bem imóvel do executado.
Ocorre que o Superior Tribunal de Justiça, ao interpretar o art. 1.647, inciso III, do Código Civil, entendeu que sua aplicabilidade é restrita aos títulos regrados pelo próprio Código [5], mudando o tratamento jurídico dado ao aval prestado sem a vênia conjugal. Explica-se.
A Corte Superior, prestigiando a segurança jurídica dos títulos de crédito, reforçou a importância dos institutos cambiários típicos, para tornar os títulos mais atrativos, favorecendo a concessão de crédito e o desenvolvimento da atividade empresarial. Com isso, esclareceu destrinchou a diferença entre o aval e a fiança, entendendo pela necessidade de se dar tratamento distinto a cada um deles.
O aval, na qualidade de garantia, visa justamente reforçar o título emitido. Segundo Luiz Emygdio é uma:
“declaração cambiária sucessiva e eventual decorrente de uma manifestação unilateral de vontade pela qual uma pessoa, natural ou jurídica, estranha à relação cartular, ou que nela já figura, assume obrigação cambiária autônoma e incondicional de garantir, total ou parcialmente, no vencimento, o pagamento do título nas condições nele estabelecidas [6]”.
Nesse sentido, a submissão do aval ao consentimento do cônjuge do avalista comprometeria a garantia, enfraquecendo os próprios títulos de crédito.
Segundo o voto do Ilustre Relator, o aval, enquanto declaração unilateral de vontade do avalista em garantir o pagamento do valor do título, somente tem lugar em obrigações cambiárias; e é instituto exclusivamente decorrente dos títulos de crédito – distinguindo-se da fiança, que é contrato, e pode ser celebrada de forma acessória a qualquer outro negócio.
Esta diferença mostra-se fundamental, porque, em se tratando de declaração unilateral, o portador do título não terá qualquer contato com o avalista, nem muito menos com documento apto a evidenciar seu estado civil. Já no caso da fiança, por ser contrato, é celebrada conhecendo-se as características e particularidades das obrigações afiançadas, do credor e do devedor afiançado no negócio garantido. E da diferença entre os dois institutos deve decorrer o tratamento distinto para cada um deles.
Vale pontuar a distinção feita por SÍLVIO DE SALVO VENOSA, na medida em que o aval é uma “declaração cambiária, enquanto a fiança é contrato, estando sujeita à autorização conjugal se o fiador é casado, o que não ocorre no aval [7]”.
Por tudo isso, o Superior Tribunal de Justiça concretizou entendimento no sentido de limitar a incidência da regra do art. 1647, inciso III, do Código Civil aos avais prestados aos títulos inominados regrados pelo Código Civil, excluindo-se os títulos nominados regidos por leis especiais.
No caso concreto, o aval foi prestado como garantia de notas promissórias, que, por sua vez são regulamentadas por legislação específica, o Decreto n. 2.044, de 13 de dezembro de 1908.
Nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, ao aval prestado como garantia a nota promissória não se exige a outorga uxória, de modo que é válido o título executivo que fundamenta a execução originária, ainda que prestado sem anuência do cônjuge, assim como é válida a penhora realizada.
[1] Art. 897. O pagamento de título de crédito, que contenha obrigação de pagar soma determinada, pode ser garantido por aval.
Parágrafo único. É vedado o aval parcial.
Art. 898. O aval deve ser dado no verso ou no anverso do próprio título.
§ 1º Para a validade do aval, dado no anverso do título, é suficiente a simples assinatura do avalista.
§ 2º Considera-se não escrito o aval cancelado.
Art. 899. O avalista equipara-se àquele cujo nome indicar; na falta de indicação, ao emitente ou devedor final.
§ 1º Pagando o título, tem o avalista ação de regresso contra o seu avalizado e demais coobrigados anteriores.
§ 2º Subsiste a responsabilidade do avalista, ainda que nula a obrigação daquele a quem se equipara, a menos que a nulidade decorra de vício de forma.
Art. 900. O aval posterior ao vencimento produz os mesmos efeitos do anteriormente dado.
[2] VENOSA. Sílvio de Salvo. Direito civil; Direito empresarial – São Paulo: Atlas, 2010, p. 238.
[3] “Art. 1.647. Ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro, exceto no regime da separação absoluta: […] III - prestar fiança ou aval;”.
[4] Art. 1.649. A falta de autorização, não suprida pelo juiz, quando necessária (art. 1.647), tornará anulável o ato praticado, podendo o outro cônjuge pleitear-lhe a anulação, até dois anos depois de terminada a sociedade conjugal.
Parágrafo único . A aprovação torna válido o ato, desde que feita por instrumento público, ou particular, autenticado.
[5] STJ - REsp: 1526560 MG 2015/0079837- 4, Relator: Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, Data de Julgamento: 16/03/2017, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 16/05/2017.
[6] EMYGDIO, Luiz. Títulos de Crédito, Ed. Renovar, 6ª ed., 2009, p. 283
[7] VENOSA. Sílvio de Salvo. Direito civil; Direito empresarial – São Paulo: Atlas, 2010, p. 238