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AO DOUTO JUÍZO DA _____ VARA CÍVEL DA COMARCA DE _____________/ [comarca de competência: foro do consumidor]
HARRY THIAGO POTTER, [nacionalidade], [estado civil], [profissão], portador do RG sob o nº ____________________, inscrito no CPF sob o nº _________________, vem respeitosamente à presença de Vossa Excelência, por meio de seu procurador signatário, que junta neste ato instrumento de procuração com endereço profissional completo para receber notificações e intimações, propor a presente
AÇÃO DE LIMITAÇÃO DE DESCONTOS COM BASE NA LEI DO SUPERENDIVIDAMENTO em face de
BANCO GRINGOTES, pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ sob o nº __________________, sem endereço eletrônico conhecido, pelas razões de fato e de direito a seguir expostas:
DOS FATOS
O autor, em //2019, realizou com a Ré uma contratação para financiamento [dados do negócio].
Assim, o valor total financiado foi de R$ ________, a serem pagos em ___ parcelas de ________, com vencimento todo dia 10 do mês.
Os juros remuneratórios previstos no contrato são de _____% ao mês e ______% ao ano.
Ocorre que com o passar do tempo, as parcelas que antes lhe pareciam plenamente possíveis de serem pagas, passaram a onerar demasiadamente o seu financeiro, de modo que estão, inclusive, prejudicando se sustento próprio, requerendo com esta presente demanda, a limitação de que o financiamento possa ser pago até o percentual máximo de 30%, independentemente de tais descontos serem feitos na folha de pagamento ou na conta corrente, vez que os descontos são feitos diretamente de seu salário e este possui natureza alimentar.
Somados, os descontos hoje sofridos consomem mais de 60% seus rendimentos líquidos da parte Autora, estando claramente em situação de superendividamento.
Portanto, necessária a presente demanda.
PRELIMINARMENTE – DO FORO DO DOMICÍLIO DO CONSUMIDOR
Impende anotar que o microssistema consumerista busca garantir ao consumidor o real exercício dos direitos a ele assegurados na legislação, dentre eles, a facilitação de sua defesa. A propósito, dispõe o artigo 6º, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor, in verbis:
“Art. 6º São direitos básicos do consumidor: (…)
VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;”
Com efeito, deve ser assegurado ao consumidor, parte, em regra, hipossuficiente no negócio jurídico e na relação processual, o amplo acesso ao Judiciário. Tratando-se de cláusula contratual que estipula foro de eleição capaz de inviabilizar a defesa judicial por parte dos consumidores, evidente que deverá ser recebido o presente feito no domicilio do demandante.
Nesse sentido:
“RECURSO INOMINADO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. NEGÓCIOS BANCÁRIOS. RELAÇÃO DE CONSUMO. FORO DE ELEIÇÃO. INCOMPETÊNCIA TERRITORIAL. DOMICÍLIO DO CONSUMIDOR QUE PREVALECE EM RELAÇÃO À CLÁUSULA DE ELEIÇÃO DE FORO.RECURSO PROVIDO PARA DETERMINAR O RETORNO DOS AUTOS AO JUÍZO DE ORIGEM PARA JULGAMENTO. (Recurso Cível Nº 71007222235, Terceira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Giuliano Viero Giuliato, Julgado em 22/02/2018)” (grifos nossos).
“RECURSO INOMINADO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. NEGÓCIOS BANCÁRIOS. RELAÇÃO DE CONSUMO. FORO DE ELEIÇÃO. INCOMPETÊNCIA TERRITORIAL. DOMICÍLIO DO CONSUMIDOR QUE PREVALECE EM RELAÇÃO À CLÁUSULA DE ELEIÇÃO DE FORO. RECURSO PROVIDO PARA DETERMINAR O RETORNO DOS AUTOS AO JUÍZO DE ORIGEM PARA JULGAMENTO. (Recurso Cível Nº 71006112668, Quarta Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Gisele Anne Vieira de Azambuja, Julgado em 29/07/2016)”. (grifos nossos).
A doutrina ao lecionar sobre o tema, destaca sobre a liberalidade do consumidor em escolher a competência que lhe permita o exercício da ampla defesa:
“Escolha do consumidor O inciso I fala em autor:“A ação pode ser proposta no domicílio do autor”. Deve-se entender, então, o termo” autor “como sendo consumidor, posto que o capítulo trata das ações judiciais propostas em face do fornecedor. É regra expressa que decorre do princípio geral de proteção ao consumidor e, neste caso, especificamente insculpido nos incisos VII e VIII do art. 6º de lei consumerista. Anote-se, também, que pouco importa a qualidade do consumidor, se pessoa física ou jurídica. Todo e qualquer consumidor tem o benefício.” (LUIZ ANTONIO RIZZATO NUNES. Comentário ao Código de Defesa do Consumidor. Saraiva. 2015, Versão Kindle 22105-22110.)
Ademais, a própria jurisprudência do c. STJ caminha no sentido de reconhecer a competência do domicílio do consumidor nos casos do art. 101 do CDC como absoluta, matéria de ordem pública. Senão, veja-se:
“DIREITO CIVIL. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. CONTRATO DE ADESÃO. ARTIGO 535, II, CPC. VIOLAÇÃO. NÃO-OCORRÊNCIA. MULTA. EMBARGOS NÃO PROTELATÓRIOS. AFASTADA. EXAME DE MATÉRIA CONSTITUCIONAL. IMPOSSIBILIDADE DE EXAME NA VIA DO RECURSO ESPECIAL. COMPETÊNCIA TERRITORIAL ABSOLUTA. POSSIBILIDADE DE DECLINAÇÃO DE COMPETÊNCIA. AJUIZAMENTO DA AÇÃO. PRINCÍPIO DA FACILITAÇÃO DA DEFESA DOS DIREITOS. COMPETÊNCIA. FORO DO DOMICÍLIO DO CONSUMIDOR. 1. Não há por que falar em violação do art. 535 do CPC quando o acórdão recorrido, integrado pelo julgado proferido nos embargos de declaração, dirime, de forma expressa, congruente e motivada, as questões suscitadas nas razões recursais. 2. É inviável a aplicação da multa prevista no parágrafo único do artigo 538 do Código de Processo Civil se os embargos declaratórios foram opostos com o manifesto intento de prequestionar a matéria deduzida no apelo especial, e não com o propósito de procrastinar o feito. Aplicação da Súmula n. 98/STJ. 3. Refoge da competência outorgada ao Superior Tribunal de Justiça apreciar, em sede de recurso especial, a interpretação de normas e princípios de natureza constitucional. 4. O magistrado pode, de ofício, declinar de sua competência para o juízo do domicílio do consumidor, porquanto a Jurisprudência do STJ reconheceu que o critério determinativo da competência nas ações derivadas de relações de consumo é de ordem pública, caracterizando-se como regra de competência absoluta. 5. O microssistema jurídico criado pela legislação consumerista busca dotar o consumidor de instrumentos que permitam um real exercício dos direitos a ele assegurados e, entre os direitos básicos do consumidor, previstos no art. 6º, VIII, está a facilitação da defesa dos direitos privados. 6. A possibilidade da propositura de demanda no foro do domicílio do consumidor decorre de sua condição pessoal de hipossuficiência e vulnerabilidade. 7. Não há respaldo legal para deslocar a competência de foro em favor de interesse de representante do consumidor sediado em local diverso ao do domicílio do autor. 8. Recurso especial parcialmente conhecido e provido. (REsp 1032876/MG, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, QUARTA TURMA, julgado em 18/12/2008, DJe 09/02/2009)”.
Portanto, requer seja reconhecido como competente o foro de domicilio da parte Demandante.
- DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS
a) DA INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E DA INVERSÃO DO ÔNUS DE PROVA
Inicialmente, impende ressaltar que há, na espécie, inequívoca relação consumerista entre as partes litigantes, de tal sorte que, além da legislação atinente ao mercado financeiro, se impõe a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90).
As partes se amoldam com perfeição aos conceitos legais de consumidor e fornecedor, nos termos dos arts. 2º e 3º, do CDC. Ademais, a relação estabelecida se enquadra na conceituação de relação de consumo, apresentando todos os aspectos necessários para a aplicabilidade do codex consumerista, vez que esta legislação visa coibir infrações inequivocamente cometidas no caso em exame.
Ademais, a sujeição das instituições financeiras às disposições do Código de Defesa do Consumidor foi declarada constitucional pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no julgamento da ação direta de inconstitucionalidade 2.591/DF DJU de 13.4.2007, p. 83.
Trata-se de redação clara da Súmula 297 do Superior Tribunal de Justiça, que assim dispõe:
Súmula 297 STJ: O Código de Defesa do consumidor é aplicável às instituições financeiras. Trata-se da materialização exata do Princípio da Isonomia, segundo o qual, todos devem ser tratados de forma igual perante a lei, observados os limites de sua desigualdade, sendo devido a inversão do ônus da prova.
Esse contexto conduz a uma inexorável desigualdade material que clama pela incidência do CDC.
O CDC no seu artigo 6º é muito claro, pois preceitua que são direitos básicos do consumidor a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como os riscos que apresentem.
Corolário lógico da aplicabilidade do CDC ao caso objeto desta demanda é a inversão do ônus probatório, conforme dispõe o art. 6º, VIII, do CDC, verbis:
“Art. 6º - São direitos básicos do consumidor: (…)
VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;”
A inversão do ônus da prova, em favor do consumidor, está alicerçada na aplicação do princípio constitucional da isonomia, “pois o consumidor, como parte reconhecidamente mais fraca e vulnerável na relação de consumo ( CDC 4º I), tem de ser tratado de forma diferente, a fim de que seja alcançada a igualdade real entre os partícipes da relação de consumo. O inciso comentado amolda-se perfeitamente ao princípio constitucional da isonomia, na medida em que trata desigualmente os desiguais, desigualdade essa reconhecida pela própria lei.”
Trata-se da materialização exata do Princípio da Isonomia, segundo o qual, todos devem ser tratados de forma igual perante a lei, observados os limites de sua desigualdade, como já deliberado pelo STJ:
“(…) aos atos técnicos praticados de forma defeituosa pelos profissionais da saúde vinculados de alguma forma ao hospital, respondem solidariamente a instituição hospitalar e o profissional responsável, apurada a sua culpa profissional. Nesse caso, o hospital é responsabilizado indiretamente por ato de terceiro, cuja culpa deve ser comprovada pela vítima de modo a fazer emergir o dever de indenizar da instituição, de natureza absoluta (arts. 932 e 933 do CC), sendo cabível ao juiz, demonstrada a hipossuficiência do paciente, determinar a inversão do ônus da prova (art. 6º, VIII, do CDC)” (REsp 1.145.728/MG, Relator o Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, DJe de 28.6.2011).
Desta feita, requer-se, desde já, o deferimento da inversão do ônus da prova, com fulcro no art. 6º, VIII do CDC.
b) DA NECESSÁRIA APLICAÇÃO DA LEI DO SUPERENDIVIDAMENTE – LIMITAÇÃO A 30% DOS RENDIMENTOS DO AUTOR, PARA GARANTIA DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA
Conforme claramente denota-se dos documentos anexos, ainda que o autor tenha assinado o contrato em total autonomia, é de se presumir que o percentual de comprometimento da sua renda conduz a uma lógica de que a sua até então autonomia é cessada, tendo em vista este superendividamento sitado, pois é situação que conduz um consumidor a contratos e recontratos, tentando pagar seus débitos, mas afundando cada vez mais, num mar de dívidas sem fim.
A situação que ora se apresenta não pode ser analisada apenas sob o prisma da legalidade dos empréstimos tomados e corretamente descontados. É necessário que seja considerado o fato de que a dignidade da pessoa humana, um dos fundamentos da República Federativa do Brasil insculpidos no art. 1º da Constituição Federal, deve ser observado e, respeitado, acima de tudo.
A soma de todos os valores do financiamento compromete mais de 60% dos rendimentos líquidos do demandante: [o gráfico abaixo foi feito no canva, adaptar para seu caso]
Portanto, é claro que com o valor de seu soldo, o autor não consegue pagar os valores consignados e sobreviver pagando as despesas necessárias ao seu mínimo existencial, estando claramente agredido em sua dignidade.
Essa realidade do chamado “superendividamento”, que é a de milhões no país inteiro [1], movimentou o Parlamento Nacional e, em 01/07/2021, foi publicada a Lei 14.181 [2], que “altera a Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 ( Código de Defesa do Consumidor), e a Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003 ( Estatuto do Idoso), para aperfeiçoar a disciplina do crédito ao consumidor e dispor sobre a prevenção e o tratamento do superendividamento.”
Essa lei acrescentou ao Código de Defesa do Consumidor, entre outros, o art. 54-A que, em seu § 1º, conceitua o “superendividamento”:
Art. 54-A. Este Capítulo dispõe sobre a prevenção do superendividamento da pessoa natural, sobre o crédito responsável e sobre a educação financeira do consumidor.
§ 1º Entende-se por superendividamento a impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem comprometer seu mínimo existencial, nos termos da regulamentação.
(…)
Como se depreende do parágrafo primeiro acima transcrito, o ponto central do conceito é a garantia da preservação do mínimo existencial da pessoa natural, que também foi introduzido pela Lei 14.181/21 como “novo direito básico do consumidor” no art. 6º, XII do CDC.
Sobre o “mínimo existencial”, o artigo 25 da Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU, 1948) dispõe:
- Todo ser humano tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e à sua família saúde, bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis e direito à segurança em caso de desemprego, doença invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência em circunstâncias fora de seu controle. 2. A maternidade e a infância têm direito a cuidados e assistência especiais. Todas as crianças, nascidas dentro ou fora do matrimônio, gozarão da mesma proteção social.
Rizzatto Nunes, escritor e Desembargador aposentado do Tribunal de Justiça de São Paulo, em artigo publicado no site "Migalhas"3, bem acentuou o seguinte:
Trata-se, na verdade, da tentativa de garantir ao ser humano um “mínimo vital” de qualidade vida, o qual lhe permita viver com dignidade, tendo a oportunidade de exercer a sua liberdade no meio social em que vive.
Esse mínimo existencial tem, portanto, relação direta com a dignidade de pessoa humana e, também, com o próprio Estado Democrático de Direito. No caso brasileiro, ele está contemplado na Constituição Federal, gerando um dever ao Estado para sua implementação concreta.
Nesse passo, sem o mínimo vital, de qualidade vida, o qual lhe permita viver com dignidade, tendo a oportunidade de exercer a sua liberdade no meio social em que vive [3], não há como assegurar dignidade à pessoa humana.
A Lei 14181/21 garante ao consumidor superendividado, na forma do par. ún. do art. 54-D, “a dilação do prazo de pagamento previsto no contrato original”, o que refere uma interpretação integrativa da norma do inciso V do art. 6 do CDC.
Confiram-se as normas:
Lei 14181/21, art. 54-D, parágrafo único: “O descumprimento de qualquer dos deveres previstos no caput deste artigo e nos arts. 52 e 54-C deste Código poderá acarretar judicialmente a redução dos juros, dos encargos ou de qualquer acréscimo ao principal e a dilação do prazo de pagamento previsto no contrato original, conforme a gravidade da conduta do fornecedor e as possibilidades financeiras do consumidor, sem prejuízo de outras sanções e de indenização por perdas e danos, patrimoniais e morais, ao consumidor.” CDC, art. 6º: “São direitos básicos do consumidor: V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas;”
O inciso XI do artigo 6º, do CDC, incluído pela Lei n.º 14.181, de 01.07.2021, assegura ao consumidor a garantia de práticas de crédito responsável, de educação financeira e de prevenção e tratamento de situações de superendividamento, preservado o mínimo existencial, o que doravante deve ser observado por todos os atores da cadeia de consumo – sejam fornecedores ou consumidores.
Por igual, a Lei 10820/2003, que dispõe sobre a autorização para desconto de prestações em folha de pagamento e dá outras providências, concretiza o limite máximo de 30% aos descontos nos vencimentos de consumidores com descontos em folha, devendo aqui ser utilizada como norma por analogia, na linha da Lei 14.181/2021, fazendo-se um necessário diálogo de fontes, aplicando-se o art. 6º § 5º, in verbis:
Lei 10820/03: “Art. 6o Os titulares de benefícios de aposentadoria e pensão do Regime Geral de Previdência Social poderão autorizar o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS a proceder aos descontos referidos no art. 1o desta Lei, bem como autorizar, de forma irrevogável e irretratável, que a instituição financeira na qual recebam seus benefícios retenha, para fins de amortização, valores referentes ao pagamento mensal de empréstimos, financiamentos e operações de arrendamento mercantil por ela concedidos, quando previstos em contrato, nas condições estabelecidas em regulamento, observadas as normas editadas pelo INSS.
§ 5o Os descontos e as retenções mencionados no caput deste artigo não poderão ultrapassar o limite de 30% (trinta por cento) do valor dos benefícios.”
Corroborando com o pedido de limitação financeira, em razão do superendividamente, temos os seguintes precedentes:
0088149-43.2016.8.19.0054 – APELAÇÃO - Des (a). MÔNICA MARIA COSTA DI PIERO - Julgamento: 17/08/2020 - OITAVA CÂMARA CÍVEL APELAÇÃO CÍVEL. INDENIZATÓRIA. EMPRÉSTIMOS BANCÁRIOS. SUPERENDIVIDAMENTO. LIMITAÇÃO EM 30% DOS DESCONTOS EFETUADOS. PM/RJ. Lei Estadual nº 279/1979. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 200 E 295 DESTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. 1. A questão diz respeito ao que se tem denominado de “superendividamento”, situação em que o consumidor compromete mais de 30% de seus rendimentos para honrar com parcelas de contratos de empréstimos. A sentença julgou procedente o pedido, sendo alvo inconformismo do terceiro réu (Banco BMG S/A). 2. A tese recursal gira em torno da legalidade dos contratos bancários realizados, uma vez que o apelado contratou vários empréstimos, mesmo ciente da dificuldade em honrá-los. 3. Preliminarmente, afasta-se a alegação de ilegitimidade passiva do apelante, uma vez que o contrato foi ajustado entre a consumidora e a referida instituição bancária, não tendo o órgão pagador qualquer ingerência na pactuação (IRDR nº 0032321-30.2016.8.19.0000). 4. Inegável que a relação jurídica entabulada entre as partes se afigura de consumo, emoldurando-se as mesmas na figura de consumidor e fornecedor (arts 2º e 3º, da Lei nº 8.078/90), de modo a ensejar a aplicação das regras do CDC, como forma de restabelecer o equilíbrio e igualdade. 5. Na hipótese, a parte autora contraiu empréstimos bancários muito além de suas possibilidades financeiras, sendo que, em nenhum momento, nega a existência da sua dívida e dos empréstimos por ela contraídos, portanto, o negócio jurídico realizado pelas partes deve ser considerado válido e eficaz. 6. No entanto, verifica-se do contracheque acostado aos autos que a parte autora recebe vencimentos no valor bruto de R$ 4.148,31, sendo descontada mensalmente a quantia de R$ 1.797,85, o que compromete percentual superior a 30% de sua renda, dificultando certamente a sua subsistência e desrespeitando o limite imposto pela legislação vigente. 7. Tratando-se de servidor militar estadual a Lei Estadual 279/1999 estabelece no artigo 93, III, que os descontos efetuados não podem ultrapassar a 30% (trinta por cento). Aplicação das súmulas 200 e 295 desta Corte de Justiça. 8. É certo que a instituição financeira deve suportar os riscos de sua atividade negocial e guardar obediência ao ordenamento jurídico na celebração de seus negócios, o que não aconteceu no caso. 9. O ordenamento jurídico, por sua vez, protege o salário, tendo em vista o seu caráter alimentar, com previsão no art. 7º, X, da Constituição Federal. Com efeito, o salário é meio de sobrevivência, assim o cumprimento do contrato não pode realizar-se em detrimento da subsistência da parte autora e de sua família, em nítida afronta aos princípios da dignidade da pessoa humana e do mínimo existencial. PRECEDENTES. 10. Desprovimento do recurso.
0058338-37.2015.8.19.0001 – APELAÇÃO - Des (a). ANTONIO CARLOS ARRABIDA PAES - Julgamento: 27/11/2019 - VIGÉSIMA TERCEIRA CÂMARA CÍVEL APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C DANO MORAL C/C TUTELA DE URGÊNCIA. SUPERENDIVIDAMENTO. VÁRIOS EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS CONTRATADOS POR MILITAR DO CORPO DE BOMBEIROS ANTERIORES AO DECRETO Nº 45.563/2016. MATÉRIA REGULADA PELAS NORMAS ESTABELECIDAS NA LEI ESTADUAL Nº 279/1979. TEMPUS REGIT ACTUM. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA PARCIAL PARA LIMITAR OS DESCONTOS DOS EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS NO PERCENTUAL DE 30% (TRINTA POR CENTO) SOBRE OS RENDIMENTOS BRUTOS DO DEVEDOR, ABATIDOS OS DESCONTOS COMPULSÓRIOS, FIXANDO-SE MULTA EQUIVALENTE AO DOBRO DO VALOR COBRADO ACIMA DA MARGEM CONSIGNÁVEL. CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS. PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL JULGADO IMPROCEDENTE. RECURSO EXCLUSIVO DO 8º RÉU PARA EXCLUSÃO DA MULTA E DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. É CEDIÇO QUE OS BANCOS NÃO POSSUEM INGERÊNCIA SOBRE OS DESCONTOS QUE SÃO REALIZADOS EM FOLHA DE PAGAMENTO, SENDO TAL ATRIBUIÇÃO DO ÓRGÃO PAGADOR DO CORPO DE BOMBEIRO MILITAR DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. AFASTAMENTO DA MULTA FIXADA NA SENTENÇA, EM CASO DE DESCONTO SUPERIOR À MARGEM CONSIGNÁVEL. OBRIGAÇÃO DE FAZER EFETIVADA POR SIMPLES EXPEDIÇÃO DE OFÍCIO AO ÓRGÃO RESPONSÁVEL PELA FOLHA DE PAGAMENTO. SÚMULA Nº 144 DESTE TJRJ. PRECEDENTE DESTA CORTE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DEVIDOS PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA DEMANDADA, POIS DEIXOU DE OBSERVAR DEVER DE CAUTELA QUANTO À CONDIÇÃO FINANCEIRA DO AUTOR, CONCEDENDOLHE CRÉDITO ACIMA DA MARGEM CONSIGNÁVEL E, PORTANTO, DANDO CAUSA À PROPOSITURA DA AÇÃO. PRECEDENTE. PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO PARA EXCLUIR A MULTA FIXADA PARA O CASO DE DESCUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO DE FAZER E DETERMINAR A EXPEDIÇÃO DE OFÍCIO AO ÓRGÃO PAGADOR DO AUTOR, A FIM DE QUE EFETUE A LIMITAÇÃO DOS DESCONTOS CONSIGNADOS EM 30% (TRINTA POR CENTO) DOS RENDIMENTOS BRUTOS DO DEVEDOR, ABATIDOS OS DESCONTOS COMPULSÓRIOS.
0017139-61.2018.8.19.0023 – APELAÇÃO - Des (a). HENRIQUE CARLOS DE ANDRADE FIGUEIRA - Julgamento: 29/09/2020 - QUINTA CÂMARA CÍVEL CIVIL. CONSUMIDOR. PROCESSO CIVIL. MÚTUO BANCÁRIO. DESCONTO EM CONTA CORRENTE. LIMITAÇÃO. Ação de obrigação de fazer a fim de limitar os descontos automáticos de prestações de mútuos bancários celebrados pelas partes a 30% (trinta por cento) dos proventos do Autor. Nos contratos bilaterais as partes devem zelar pela boa-fé objetiva e observar o dever de mútua cooperação que necessariamente implica no ônus de ambas apurarem se é factível o pleno adimplemento das obrigações recíprocas. Irrelevante a forma definida no contrato para liquidar a obrigação, se por desconto em folha ou débito em conta, pois se consideram os critérios que viabilizam o reexame do negócio jurídico pela teoria da base negocial independente da forma pela qual se determina a obrigação de um dos contratantes, e o julgamento se fundamenta na causa de pedir, consistente no superendividamento do Autor. Importa, na espécie, envidar esforços para recuperar a possibilidade de adimplemento da obrigação. Por isso, limitar o débito automático na conta corrente do Autor a 30% (trinta por cento) de seus ganhos para satisfazer os créditos dos Réus reequilibra a correlação das obrigações e viabiliza sejam plenamente adimplidas. O fato de o Réus celebrarem com o Autor contrato de cartão de crédito não os liberam do limite de 30% (trinta por cento), pois este se refere à possibilidade de o consumidor adimplir a obrigação sem prejuízo da sua subsistência. A parte vencida na lide responde pelos ônus da sucumbência na forma dos artigos 85 do Código de Processo Civil. Recurso desprovido.
Considerando o caráter alimentar dos vencimentos e o princípio da razoabilidade, mostram-se excessivos tais descontos, na formo como vêm sendo realizados, e por isso busca o Autor a limitação de tais, para 30% dos seus rendimentos, para assegurar tanto o adimplemento da dívida, quando o seu sustento próprio e de sua família, como já vem decidindo o STJ, a exemplo do Recurso Especial 1237.112 RS.
i) DA ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA
O Autor é pessoa pobre na acepção do termo e não possui condições financeiras para arcar com as custas processuais e honorários advocatícios sem prejuízo do próprio sustento, razão pela qual desde já requer o benefício da Gratuidade de Justiça, assegurados pela Lei nº 1060/50 e consoante o art. 98, caput, do novo CPC/2015, verbis:
“Art. 98. A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei.”
Mister frisar, ainda, que, em conformidade com o art. 99, § 1º, do novo CPC/2015, o pedido de gratuidade da justiça pode ser formulado por petição simples e durante o curso do processo, tendo em vista a possibilidade de se requerer em qualquer tempo e grau de jurisdição os benefícios da justiça gratuita, ante a alteração do status econômico.
Para tal benefício, parte Autora junta declaração de hipossuficiência e comprovante de renda, os quais demonstram a inviabilidade de pagamento das custas judicias sem comprometer sua subsistência, conforme clara redação do Código de Processo Civil de 2015:
“Art. 99. O pedido de gratuidade da justiça pode ser formulado na petição inicial, na contestação, na petição para ingresso de terceiro no processo ou em recurso.
§ 1º Se superveniente à primeira manifestação da parte na instância, o pedido poderá ser formulado por petição simples, nos autos do próprio processo, e não suspenderá seu curso.
§ 2º O juiz somente poderá indeferir o pedido se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade, devendo, antes de indeferir o pedido, determinar à parte a comprovação do preenchimento dos referidos pressupostos.
§ 3º Presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural.”
Assim, por simples petição, sem outras provas exigíveis por lei, faz jus, parte Autora, ao benefício da gratuidade de justiça:
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. JUSTIÇA GRATUITA. INDEFERIMENTO DA GRATUIDADE PROCESSUAL. AUSÊNCIA DE FUNDADAS RAZÕES PARA AFASTAR A BENESSE. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. CABIMENTO. Presunção relativa que milita em prol da autora que alega pobreza. Benefício que não pode ser recusado de plano sem fundadas razões. Ausência de indícios ou provas de que pode a parte arcar com as custas e despesas sem prejuízo do próprio sustento e o de sua família. Recurso provido. (TJ-SP 22234254820178260000 SP 2223425-48.2017.8.26.0000, Relator: Gilberto Leme, Data de Julgamento: 17/01/2018, 35ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 17/01/2018).”
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. GRATUIDADE DA JUSTIÇA. CONCESSÃO. Presunção de veracidade da alegação de insuficiência de recursos, deduzida por pessoa natural, ante a inexistência de elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão da gratuidade da justiça. Recurso provido. (TJ-SP 22259076620178260000 SP 2225907-66.2017.8.26.0000, Relator: Roberto Mac Cracken, 22ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 07/12/2017)”.
A assistência de advogado particular não pode ser parâmetro ao indeferimento do pedido:
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. PEDIDO DE GRATUIDADE DE JUSTIÇA. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. HIPOSSUFICIÊNCIA. COMPROVAÇÃO DA INCAPACIDADE FINANCEIRA. REQUISITOS PRESENTES. 1. Incumbe ao Magistrado aferir os elementos do caso concreto para conceder o benefício da gratuidade de justiça aos cidadãos que dele efetivamente necessitem para acessar o Poder Judiciário, observada a presunção relativa da declaração de hipossuficiência. 2. Segundo o § 4º do art. 99 do CPC, não há impedimento para a concessão do benefício de gratuidade de Justiça o fato de as partes estarem sob a assistência de advogado particular. 3. O pagamento inicial de valor relevante, relativo ao contrato de compra e venda objeto da demanda, não é, por si só, suficiente para comprovar que a parte possua remuneração elevada ou situação financeira abastada. 4. No caso dos autos, extrai-se que há dados capazes de demonstrar que o Agravante, não dispõe, no momento, de condições de arcar com as despesas do processo sem desfalcar a sua própria subsistência. 4. Recurso conhecido e provido. (TJ-DF 07139888520178070000 DF 0713988-85.2017.8.07.0000, Relator: GISLENE PINHEIRO, 7ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE: 29/01/2018)”.
Assim, considerando a demonstração inequívoca da necessidade da parte Autora, tem-se por comprovada sua necessidade, fazendo jus ao benefício.
Cabe destacar que o a lei não exige atestada miserabilidade do requerente, sendo suficiente a “insuficiência de recursos para pagar as custas, despesas processuais e honorários advocatícios”(Art. 98, CPC/15), conforme destaca a doutrina:
“Não se exige miserabilidade, nem estado de necessidade, nem tampouco se fala em renda familiar ou faturamento máximos. É possível que uma pessoa natural, mesmo com bom renda mensal, seja merecedora do benefício, e que também o seja aquela sujeito que é proprietário de bens imóveis, mas não dispõe de liquidez. A gratuidade judiciária é um dos mecanismos de viabilização do acesso à justiça; não se pode exigir que, para ter acesso à justiça, o sujeito tenha que comprometer significativamente sua renda, ou tenha que se desfazer de seus bens, liquidando-os para angariar recursos e custear o processo.” (DIDIER JR. Fredie. OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Benefício da Justiça Gratuita. 6ª ed. Editora JusPodivm, 2016. p. 60)
Por tais razões, com fulcro no artigo 5º, LXXIV da Constituição Federal e pelo artigo 98 do CPC, requer seja deferida a gratuidade de justiça parte Autora.
j) DA AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO (CPC, art. 319, inc. VII)
Em homenagem ao princípio da razoável duração do processo, o Promovente opta pela não realização de audiência conciliatória ( CPC, art. 319, inc. VII), haja vista a escassa possibilidade de transação judicial entre os litigantes.
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